UFPI realiza estudo de fóssil humano achado no Sul do Piauí

O indivíduo parcialmente mumificado foi resgatado no sítio arqueológico de Lagoa Cercada, no município de Colônia do Gurgueia, em 2013.
créditos: O dia

A Universidade Federal do Piauí deu início a um estudo pioneiro de um fóssil humano resgatado no sítio arqueológico de Lagoa Cercada, localizado no município de Colônia do Gurguéia, município localizado a 418 km de Teresina. O estudo paleobiológico, coordenado pela professora Claudia Cunha, da Graduação em Arqueologia e Conservação de Arte Rupestre, consiste em reconstruir, a partir dos ossos ou do que restar do indivíduo, a identidade dele, a sua história de vida e suas características biológicas. O material encontra-se abrigado no Núcleo de Antropologia Pré-Histórica (NAP) da UFPI.

 

 

De acordo com a professora, a pesquisa tem como objetivo identificar as características do indivíduo, como sexo e faixa etária. "A gente procura saber a partir do material que existe qual era o sexo do indivíduo, a faixa etária em que ele morreu, se ele tinha evidências de doenças, de violência, etc. Para além da análise macroscópica, outros estudos laboratoriais dos ossos e dos dentes nos permitem saber a datação desse indivíduo, que tipo de vida ele tinha, o que ele comia, qual a fonte d"água que ele consumiu ao longo da vida, conseguimos até saber se aquele indivíduo nasceu e morreu naquele lugar, ou se ele migrou para aquele lugar ao longo da vida", afirma.

O indivíduo estudado foi resgatado em 2013 por populares acompanhados pelo dono da terra onde está o sítio funerário. A professora explica que esse resgate, apesar de ter sido realizado por populares, foi feito com muito cuidado. A partir da análise do esqueleto foi possível perceber que o fóssil humano encontrado pertencia a um indivíduo idoso, do sexo masculino. "Apesar de ter uma série de patologias, por incrível que pareça, à época, seria um indivíduo saudável, tanto que conseguiu chegar à terceira idade, o que era mais raro antigamente", destaca a professora.

O indivíduo encontra-se parcialmente mumificado. A coleta resultou na recuperação do crânio articulado com mandíbula; vértebras cervicais articuladas e demais vértebras e sacro desarticulados; escápula, clavícula, costelas, coxal e esqueleto apendicular todos esquerdos (exceto tíbia, fíbula e ossos do pé ausentes). A mão esquerda está presente e completamente mumificada. Tecidos moles preservados cobrem parcialmente o crânio e clavícula, e completamente o antebraço e mão esquerdos.

Foram recuperados também materiais e, inclusive, restos de uma rede usada como mortalha. De acordo com a professora, alguns grupos indígenas até hoje fazem enterramento em redes, pois para eles a rede é um elemento de contato com o mundo dos mortos. Uma das interpretações avançadas por antropólogos que estudam populações atuais é de que alguns grupos acreditam que através do punho da rede que o espírito sai do corpo do morto para ir para a aldeia dos mortos, como um canal que liga os dois mundos. Isso explica o motivo do indivíduo ter sido enterrado dessa maneira, aspecto identificado com base na análise de antropologia funerária do material resgatado do sítio.

Segundo o pós-doutorando Tiago Tomé, normalmente na Bioarqueologia não são trabalhadas necessariamente as perspectivas do indivíduo, pois o que realmente interessa é a população, buscando compreender como essa população vivia, quais eram as dificuldades que enfrentava. "Em primeira análise, esse indivíduo nos permite reunir dados, que esperamos juntar aos de outros indivíduos, para termos uma imagem dessa população do passado que ocupava essa região do estado do Piauí nesse período. Porque aí nós conseguiremos entender quais são os principais problemas que essa população enfrentava no seu dia a dia", explica.

Essas informações foram apresentadas recentemente em um congresso realizado em Portugal e é o primeiro estudo paleobiológico feito por profissionais da UFPI. "Nós voltaremos à gruta que ele foi encontrado, provavelmente em abril, e retomaremos as escavações em busca de mais materiais deste enterramento e de outras possíveis sepulturas na gruta. Estamos também com um projeto de pesquisa em São Miguel do Tapuio, para escavar mais duas grutas-necrópole", finaliza a Profa. Claudia Cunha.


COLUNISTA
Eudes Martins
COMPARTILHE O LINK DA MATÉRIA